sexta-feira, 17 de julho de 2020

Saudade da praça (e dos “parças”)



Mais um dia se inicia e lá se vão os mascarados. Mais um dia corrido e a pressa para não perder o ônibus corre ao lado. Se antes, por correrem atrás dos ônibus já ficavam ofegantes, hoje ficam ainda mais. - Corre! Ei, motorista, me espere. Que sufoco. Uma falta de ar os assola neste momento. Diria até mais, falta de amor, de carinho, de toque, de saliva, de abraços, de conversas, de amigos, de bares, baladas, balas, chicletes e falta da praça.

Praça ou “parças”? Praça mesmo (mas também dos “parças”). Que falta a praça me faz. Andar pelos seus caminhos largos e sinuosos. Comer pastel, um crepe ou um lanche, tomar um suco ou um refrigerante. Ficar ali de bobeira vendo as pessoas passarem com seus filhos, netos e até bisnetos. Vendo casais jovens, de meia-idade ou outros casais já naquela idade que é tanta sabedoria que o corpo padece. Como faz falta ver as pessoas se divertindo, saindo com os amigos, com os pais e com os filhos.

Faz muita falta sentar à sombra daquelas árvores que estão ali há muito tempo acompanhando cada pessoa que por ali passa. Se elas falassem acho que seriam uma ótima companhia para sentar e bater uma prosa. Elas contariam do tempo em que ali era apenas um terrão danado. E se lembrariam de quando as primeiras pessoas chegaram, quando o primeiro trem apitou chegando à estação. Quando as primeiras pessoas cantaram no antigo coral. E com certeza lembrariam com tristeza do dia em que o demoliram. Talvez até uma gota triste de seiva escorresse de suas cascas.

Essas árvores contariam como viram cada cidadão da nossa pequena cidade nascer, crescer, subir em seus galhos e pousarem iguais a um passarinho. Contariam como fulano, uma vez, brincando de esconde-esconde, escondeu-se atrás do seu tronco e as outras crianças não o achavam. Elas se lembrariam dos tempos em que as torcidas comemoravam os títulos dos seus clubes por ali. Hoje elas certamente estão tristes esperando por uma companhia, esperando para ver mais uma criança crescendo e virando um adulto. São tempos difíceis para nós e para elas também.

Eu sinto a falta da praça e dos “parças”. Sinto falta de cumprimentar dando a mão para alguém, já que agora nos cumprimentamos com o cotovelo – que jeito mais sem sal e sem açúcar de se cumprimentar alguém. Mas é o que temos para hoje, cumprimentos com os cotovelos, rostos mascarados e uma esperança louca de que tudo isso vire passado o mais rápido possível. Vivemos com a esperança de que acordaremos amanhã com alguém aplicando uma injeção em nosso braço e dizendo com uma voz suave – pronto, acabou! E com certeza será a injeção mais gostosa que tomaremos na vida.

 

Joao Paulo Pinheiro Tonon

Joaozinhopinheiro.escritor@gmail.com


sexta-feira, 10 de julho de 2020

Não deixe para depois



A semana, apesar de o domingo ser o primeiro dia oficialmente, só começa na segunda-feira. A segunda é o  primeiro dia não oficial, pois é o dia que a maioria vai trabalhar. O primeiro dia de um mês é o dia primeiro, mas se ele cair em um sábado o mês só começa pra valer no primeiro dia útil seguinte. Assim é também com o ano, começa no primeiro dia de janeiro, mas geralmente é um feriado emendado a um final de semana, e aí então dizemos que o ano só começa na segunda-feira. Por isso, acabamos depositando todas as nossas esperanças nesse dia, a tão famosa segundona brava.

Por exemplo, se temos que fazer algo, começar um novo projeto, um novo estudo, sempre esperamos chegar a segunda, ou o próximo mês ou o próximo ano. Geralmente nos esquecemos daquele velho ditado - não deixe para amanhã o que você pode fazer hoje. Por que postergar algo pra a próxima segunda, para o próximo mês, ou pior, para o próximo ano? É medo de enfrentar? Será apenas um hábito? Na verdade eu também não sei. O que eu sei é que qualquer dia é dia para começar. Não precisamos nos esconder até a próxima segunda. Podemos dar a cara a tapa na terça, quarta, quinta, sexta, sábado, domingo, no dia dois, três, quatorze, enfim, todos os dias são feitos de começo e fim, então pra que esperar o primeiro dia da semana?

Será que existe uma regra que só se pode começar algo no começo da semana? Se existe eu desconheço. Não precisamos chegar no dia primeiro de janeiro para iniciarmos um dieta, não precisamos do começo do mês para parar de fumar, parar de beber, ou para começar a fazer exercícios, para dar um jeito no quartinho da bagunça, por exemplo. Não precisamos da segunda-feira para iniciar algum estudo, algum curso, ou realizar algo que almejamos. Não são só as semanas, meses e anos que têm começo, todos os dias têm seus começos. E não precisamos também esperar um dia para mudarmos, podemos mudar agora, no meio de um dia, no meio de uma semana. Qualquer hora do dia ou da noite é a hora perfeita para a mudança.

Talvez se esperarmos muito, ou esperarmos o dia primeiro ou a segunda, pode ser que a vontade passe, pode ser que esqueçamos daquilo que tínhamos nos comprometido a fazer. Se deixarmos para amanhã o tempo passa e não volta mais. Todos os dias são iguais e repletos de chances para começarmos ou terminarmos algo. Procastinar é adiar uma ação e, a não ser que seja vital o adiamento, não procrastine.

João Paulo Pinheiro Tonon

joaozinhopinheiro.escritor@gmail.com

 

sexta-feira, 3 de julho de 2020

Sobre não Sermos Previsíveis




Quantas vezes acordamos com vontade de fazer algo que realmente nos traria satisfação, mas não fazemos. Talvez por medo ou receio do que iriam falar. Talvez por acharmos que não compensa ou não iria ser tão legal assim. Ou simplesmente por não termos a disposição, a coragem e a vontade necessária para irmos atrás daquilo que buscamos. "Alerta", este não é um texto de autoajuda, é só sobre uma inspiração que veio de uma frase, que por acaso eu ouvi em algum filme e que agora não me lembro em qual foi.

Quando foi a última vez que fizemos algo realmente diferente e emocionante em nossas vidas? Quantas vezes por semana ousamos fazer algo diferente, algo surpreendente, algo que nos desafiaria? Ficamos por muitas vezes acomodados e sentados em cima daquilo que nos é fácil. Cobrimos o fácil com um edredom quentinho, fechamos a janela para não deixá-lo escapar, colocamos cerca elétrica, aumentamos o muro e adotamos um cachorro enorme, tudo para defender nosso mundo de facilidades.

O cômodo não precisa de explicações, é simplesmente fácil de se estacionar nele, é fácil entrar e sair, é fácil dormir e acordar, enfim, está tudo pronto, é só continuar vivendo e fazendo tudo igual para não termos trabalho. Basta colocarmos nosso despertador no mesmo horário, fazermos sempre as mesmas coisas, andarmos sempre com as mesmas pessoas, não nos darmos a chance de conhecer pessoas diferentes, termos sempre o mesmo itinerário, andarmos sempre pelas mesmas ruas. É simples continuarmos a sermos sempre iguais. Difícil é ser ousado e fazer algo diferente, ser alguém diferente.

Geralmente temos medo da mudança, medo do novo e aceitamos o velho mesmo. É o famoso simples que dá certo. Mas se não queremos mais o simples, se queremos algo a mais, ou queremos algo que sempre sonhamos, é preciso audácia, é preciso ser destemido(a), sair do conforto das coisas rotineiras que nos cercam. Muitos sucessos não são alcançados só porque temos medo de que não dê certo, ou pelo receio de algum tipo de pensamento minimalista que nos cerca. Muitas coisas são inventadas e esquecidas em gavetas, porões, casas abandonas ou esquecidas em pensamentos que deixamos de por para fora (os pensamentos vêm e achamos que seria uma completa idiotice e depois esses pensamentos se perdem no meio de um vazio de outros pensamentos). Então, um certo dia, vemos em algum lugar alguém fazendo exatamente aquilo que achamos que seria chato, e aí pensamos: Eu deixei de por pra fora aquele pensamento e outra pessoa o fez por mim.

Enquanto continuarmos nos cercando de medos inexistentes, de falsas vergonhas, enquanto continuarmos a viver em uma bolha de comodismo e não ousarmos, seremos sempre os mesmos. Continuaremos previsíveis e fáceis de se decifrar. Teremos sempre os mesmos papos, os mesmos jeitos, mesmos gostos e seremos sempre um refresco sem açúcar. O medo vai sempre estar aí para todo mundo, resta querermos enfrentá-lo ou não. É preciso sairmos da nossa zona de conforto, vermos as coisas de uma outra maneira - antes que algo nos force a enxergarmos as coisas de uma outra perspectiva. Muitas pessoas passam por traumas e passam a ter coragem de enfrentar um desafio, passam a valorizar outras coisas que antes desprezavam. Mas não precisamos esperar que algo assim aconteça para tomarmos atitude e fazermos aquilo que sempre tivemos vontade. Não é preciso perder algo para se ter vontade de vencer. Basta enfrentarmos o nosso medo e seguir em frente seja lá o que vier para impedir o nosso crescimento.

 

João Paulo Pinheiro Tonon

joaozinhopinheiro.escritor@gmail.com