Ultimamente
tenho ido a pé para o trabalho. Meu trabalho fica perto da minha casa, cerca de
setecentos metros mais ou menos (o que dá uns sete ou oito quarteirões). Por
isso, levanto as seis e trinta da madrugadaça (risos) e demoro uns cinco
minutos para conseguir abrir apenas um olho – geralmente o esquerdo. Com os
dois olhos já abertos eu vou ao banheiro escovar os dentes, coloco a roupa do
serviço e vou para o trabalho.
Indo a pé ao trabalho,
vou percebendo todos os detalhes do caminho. Abrindo o portão de casa já me
deparo com a grama verde do meu jardim, com o ipê-amarelo cada dia maior no
limite entre a calçada e a rua. Percebo materiais de construção na calçada do
vizinho e sei que pela décima vez em cinco anos ele deve estar reformando o
fundo da casa dele. Algumas casas adiante eu vou para a rua porque sei que tem
cachorros que espreitam nas sombras, com algum tipo de espírito maligno dentro
deles, só para me fazerem pular da calçada para a rua com o susto (assim eu
poupo o trabalho deles).
Uma leve
descida para relaxar e logo vem a grande subida, antes de chegar ao meu
destino. Mas sem antes passar pela pracinha do buracão - carinhosamente chamada
assim desde que conheço. Pessoas a atravessam indo para os seus trabalhos,
alguns a atravessam voltando para suas casas depois de ter trabalhado à noite.
O mercadinho em frente já está aberto vendendo pão para o café dos moradores
das redondezas.
Enfim, a grande
e temida subida, enfrentada com coragem por este que vos escreve, ofegante sim,
porém corajoso. Mesmo em meio a essa luta com a tão imponente subida consigo
curtir o momento. Subo pela calçada, mas tenho que ficar desviando dos galhos
de uma árvore que provavelmente precisa de uma poda. Ao final da subida tem uma
porta de um comércio que nunca a essa hora está aberta. O nome desse comércio
sempre me chamou a atenção e mesmo sabendo que ele sempre está ali, eu faço
questão de ler e imaginar o porquê do nome Meloso´s Car (deve ser o apelido do
dono).
Chego enfim ao
meu trabalho com uma sensação tão boa que, sei que se eu fosse de carro ou moto
eu não a teria tal. Refleti em alguns aspectos, olhei jardins, cumprimentei
pessoas, enxerguei detalhes de algumas casas pelo caminho que nunca havia
notado. Andei sem pressa, andei curtindo cada passo, olhando cada árvore com
atenção, cada pássaro, cada cachorro, cada gato ou pessoa. Senti cheiro de
café, de pão, de grama cortada. Ouvi carros e motos passando, passarinhos
cantando, televisões ligadas. Toquei nas folhas, nas grades, nos muros. Falei
bom dia, oi, como vai, até mais tarde.
O caminho é
para ser vivido e não apenas para passarmos por ele. Como dizia aquela cantora,
“a felicidade está no caminho e não no final”. Temos tanta pressa para chegar,
como temos para irmos embora. Saímos de carro a toda velocidade e não
respeitamos idosos atravessando a rua, não respeitamos mães com carrinhos de
bebês e passamos depressa por perto deles. E quando chegamos ao nosso destino
vemos que perdemos toda a beleza do caminho. Perdemos todas as sensações de
prazer que o caminho nos proporciona. Mas confesso que, durante a tão malvada
subida eu penso em ganhar uma carona que me leve até o topo.
Muito bom, curti demais. Faz-me sentir saudades dessa cidade.
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